Entrevista do Jornal Expresso: Contratar um CEO por seis meses pode ser eficaz

De janeiro a junho deste ano cerca de um terço (33%) dos 1235 presidentes executivos (CEO) de empresas americanas que deixaram os seus cargos foram substituídos por gestores interinos.
Os dados são da empresa de recrutamento executivo Challenger, Gray & Christmas e compararam com 9% registados naquele país e nos primeiros seis meses do ano passado. Traduzem a tendência de crescimento do recurso a líderes “temporarios” por parte das empresas.
Na maior parte dos casos quem assumiu o leme foram gestores experientes, recrutadores fora da organização, que aceitaram a missão de manter a mesma a funcionar até que seja nomeado um líder permanente. A sua missão pode durar seis meses, um ano ou mais. Independentemente do tempo que ficam, identificam oportunidades de melhoria, definem um plano, executam-no e saem para a próxima missão.
Em Portugal não há dados que quantifiquem o recurso à contratação de gestores interinos. Rui Serapicos, diretor-geral da Acumen Strategy e presidente da Associação Interim Management (AIM), explica que o conceito (de que é exemplo a missão liderada pela KPMG na organização da Expo’98) tem feito o se caminho por cá e a procura por estes profissionais tem aumentado, mas “ainda enfrenta desafios culturais” e algum preconceito no que toca a “recrutar um profissional externo à empresa por um período definido para liderar projetos estratégicos”.
Mas considera que há muitos benefícios que estes profissionais podem trazer.
Quem são, afinal, estes gestores interinos? “São, regra geral, profissionais perto dos 50 anos (embora comecem a aparecer alguns mais jovens), altamente qualificados e com muita experiência em áreas críticas à gestão, como as financeiras, operacionais, comerciais, de gestão de pessoas”, explica o presidente da AIM. “São gestores que conseguem ler muito bem o contexto da empresa, os desafios, o acionista” e, com base nisto, “elaborar um diagnóstico, definir um plano e executá-lo, tendo em conta os objetivos para os quais foram contratados”, acrescenta, notando que estas pessoas “vão às empresas resolver problemas, executar soluções”.
Paulo Jorge é um desses gestores. O atual líder da Easy Talent, empresa fornecedora de serviços de gestão interina, trabalhou 30 anos na banca. Quando saiu, em 2019, começou a
desenvolver projetos em empresas como gestor interino, incluindo tecnológicas. É para pequenas e médias empresas ou empresas familiares que se diz mais direcionado. E dá como exemplo “uma empresa familiar do sector metalomecânico, com um processo de decisão difícil, que nos procurou numa altura em que perdeu um grande cliente. Estava em dificuldades e foi preciso reestruturar dívida, procurar novos investidores, aumentar a exportação e crescer para fora de Portugal”.
Na missão de um líder interino cabem muitas valências, mas “situações de crise ou reestruturação de empresas, sucessões, fusões e aquisições ou substituições temporárias de líderes” são os motivos mais comuns que levam a contratar um gestor interino. E é também nestes casos que a sua atuação pode trazer mais vantagens.
Atuar com Rapidez
“Os gestores interinos estão prontos para atuar com rapidez e eficácia num determinado sector, indústria ou missão”, explica Mário Fernandes, CEO da Experienced Management, outra empresa a atuar neste segmento, reforçando que, “tratando-se de profissionais muito experientes com sólidas competências para solucionar desafios muito concretos, podem ser determinantes para solucionar desafios pontuais identificados pelas organizações em determinado momento”. E exemplifica: “Somos muito procurados por empresas que querem internacionalizar para outros mercados ou reestruturar determinadas áreas, processos que exigem competências específicas, mas que não são uma necessidade permanente.”
Os especialistas ouvidos pelo Expresso reconhecem as vantagens desta ferramenta de gestão, mas não negam que há desafios. “O facto de ser alguém de fora que chega para questionar as coisas e executar mudanças pode, em algumas empresas, ser uma força de bloqueio”, reconhece Paulo Jorge, notando, porém, que “isto é, na prática, uma vantagem”, porque “é alguém que chega, não está comprometido com nenhum paradigma da organização, analisa e propõe soluções. Pode ajudar as empresas, sobretudo as de menor dimensão e com gestão menos profissionalizada, a crescer”.
Rui Serapicos argumenta que “entrar no comboio em andamento nem sempre é fácil, sobretudo porque, na maior parte dos casos, estes gestores entram nas empresas em momentos de tensão, de crise, quebra de confiança nas equipas, e são chamados a mostrar resultados muito rápido”. O líder da Acumen e presidente da AIM lembra que estes gestores “não têm seis meses para mostrar resultados”.
Texto de Cátia Mateus do Jornal Expresso

